1- Viajar vicia
Assim que pisei os pés na Romênia e que o momento “que merda que eu vim fazer aqui?” passou, fiquei encantada pelo país. Pela cultura, pelos construções históricas, pela indiferença dos romenos às vitrines, tão bagunçadas e quase ocultas, diferentes das nossas arrumadas com tanto esmero e pensadas estrategicamente para vender mais. E por como isso era, assim como os prédios cinzas das regiões proletárias, um vestígio claro dos tempos socialistas. Fiquei encantada pelo sistema de ônibus completamente ilógico. Pela culinária um tanto sem tempero para o nosso paladar brasileiro acostumado aos gostos fortes. Pela moda, tão despojada. Pela cultura da ostentação, que já existia por lá muito antes de ficar famosa aqui no Brasil com MC Guimê e afins. Pelas ruas com tantos paradoxos. Pelas diferenças que separam esse país tão subestimado pelos europeus do Brasil e pelas semelhanças que unem a gente. E foi assim com todos os outros lugares, seja no Brasil ou lá fora, que tive oportunidade de visitar desde então. Viajar – e todos os encantamentos que vêm junto – vicia.
2- Nada é tão libertador quanto a sensação de estar em um lugar novo onde você é completamente anônimo
Me lembro de quando cheguei em Veneza, cansada, com sono, completamente quebrada de grana e olhar estarrecida para o pôr-do-sol mais bonito que já vi na vida. No meio de tantos italianos, tantos turistas, tanta pizza, tanto gelato, tanta água, tanta casinha colorida na beira-mar, me senti feliz e completamente anônima, como se eu estivesse ali de passagem, de figurante, mudando a minha vida e, de alguma forma, afetando as outras como um ser invisível que não pode ser tocado, cheirado ou percebido. Existe algo de libertador nesse sentimento de anonimato que temos quando viajamos. Ele nos faz desprender das nossas amarras sociais, dos nossos próprios preconceitos, tentar novos hábitos, vestir novas roupas, ir à novas festas, fazer novos amigos e se encantar com cenários diferentes dos usuais. Quando você se desloca tanto em tempo e espaço, tudo o que sobra é a aceleração – não é assim que diz a física? A gente acelera, sem nada mais importar e, de repente, tá em outro lugar, outro momento e é por isso que eu acredito que…
3-…viajando, somos mais nós mesmos
Justamente por sermos tão desconhecidos em terras novas, nos soltamos mais. Não me refiro a fazer nada ilícito, apenas a comportamentos nos quais somos moldados, seja pela nossa família, pelos nossos amigos ou por nós. Quantas vezes crescemos ouvindo nossos pais dizendo que somos x? E os amigos falando que somos y? São tantas percepções externas (e até mesmo internas) que acabamos formando um estereótipo de quem somos. Nos agarramos tão fortemente a essa visão cheia de adjetivos que fica difícil perceber as mudanças sutis de personalidade, de valores e de pensamento que sofremos todos os dias. Quando viajamos, mergulhamos no desconhecido e, ironicamente, em um mar de autoconhecimento. Amparados pelo anonimato das viagens, somos a versão mais pura, crua e humana de nós mesmos.
4- Sair da zona de conforto se torna uma nova zona de conforto
Uma vez que você experimenta as liberdades de viajar e quebra o medo de sair da sua zona de conforto, você procura fazer isso de diferentes maneiras no seu dia a dia, seja viajando mais, seja procurando novos desafios, novos empregos, novos cursos ou um novo hobby. Uma vez que você sai dela, é muito difícil voltar. Tão de difícil que, pra muita gente (e eu me incluo nesse grupo), estar fora da zona de conforto é, de certa forma, uma zona de conforto. E o inverso acaba acontecendo: difícil agora é criar uma rotina, pensar em um planejamento a longo prazo, ter disciplina com tarefas habituais… Não sei dizer com propriedade sobre como evitar que isso aconteça, mas decidi, já que os desafios de uma viagem não eram tão desafiadores e nem o conforto da rotina tão tedioso, que a minha meta seria viver no meio termo, que isso sim seria sair da zona de conforto: conciliar uma vida tradicional, um emprego rotineiro e as aventuras e descobertas de um viajante. Não é fácil, mas ninguém disse que seria, certo?
5-Você nunca mais vai conseguir guardar dinheiro
Tirando as raras exceções que recebem um salário consideravelmente gordo, quem gosta muito de viajar não consegue gastar dinheiro com qualquer outra coisa que não seja… viajar. Esqueça os celulares de última geração, festas caríssimas open bar, carros, apartamentos, casas… A prioridade de quem se apaixona por todo o sentimento que as viagens rumo ao desconhecido proporcionam é destinado para novas passagens, muitas delas sem data de volta. Talvez seja um problema meu e da minha incapacidade crônica de fazer contas e controlar com decência mínima uma tabela de gastos no Excel, mas minha poupança vive vazia, especialmente agora que acabei de gastar o pouco que juntei pra visitar meus amigos no Rio de Janeiro.
De 2011 pra cá, foram muitos novos lugares. Assim que voltei da Romênia, fui conhecer o Nordeste brasileiro pela primeira vez. Ganhei, no ano seguinte, uma bolsa de estudos na Dinamarca que me deixou voltar pra Europa e nem assim consegui entender como, em um espaço tão pequenininho de terra, coabitam tantos países e culturas completamente diferentes entre si.
No fim, a pessoa que embarca no aeroporto nunca é a mesma pessoa que volta para dar abraços cheios de saudade. Além da bagagem quase sempre mais cheia e pesada, ela traz também reflexões sobre a vida e sobre o mundo que, de alguma forma, a tornam uma pessoa melhor. E, junto, muitos, muitos planos para novas viagens.
Qual a próxima parada?
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